Há muito tempo atrás -- mas ainda nessa galáxia -- a Editora Globo publicou a coleção "Desenho e Pintura". E a garotinha de 9/10 anos que eu era (nunca consigo ter certeza do ano, se foi em 1989 ou 1990) ficou maluca com a ideia de ter uma coleção de livros que de fato lhe ensinariam a desenhar e pintar. Então ela pentelhou o pai da melhor forma possível para que ele comprasse essa coleção. Ele comprou os dois volumes iniciais, pq... Bem, vc já viu alguma coleção que não tente te pegar dando logo no início 02 livros?
Infelizmente, para não escapar da tradição de coleções incompletas da família, essa também parou por aí -- meu pai dizia que era muito cara (ainda mais quando descobriu que ela ainda teria mais 10 volumes) e achou que eu não fiquei animada o suficiente com os dois primeiros... Não é que eu não fiquei animada, hoje em dia eu sei reconhecer que o sentimento na verdade foi: frustração.
Veja bem, ninguém na minha família é "artístico praticante" -- especialmente não em desenho e pintura -- então ninguém conseguiu avaliar muito bem o quão fora da minha alçada esses livros estavam: eles falavam de papéis que até então eu nem sabia que existiam, que depois disso (mundo pré internet) eu continuava sem saber onde encontrar e de materiais importados que eu nem sabia onde conseguir... Dar para uma criança um livro sobre aquarela, quando a da Faber-Castell era um sonho de consumo, não ressoava muito.
Esses livros me assombraram por anos, mesmo tendo sido dado com as melhores das intenções -- e até hoje, mesmo depois de ter completado a coleção via sebo -- eu ainda culpo muito do trauma que eles causaram pelo acúmulo de materiais de desenho e uma surreal esperança que adquirir esses materiais vá de fato fazer alguma diferença na minha vida. Durante muitos anos eu fiquei com a minha mente de criança obcecada com o fato de que eu não conseguia fazer as coisas como "devia" porque eu não tinha os materiais certos, como os dos livros.
Acesso a bons professores, pessoas que mexessem com arte ou qualquer coisa do tipo poderiam ter corrigido essa minha distorção -- mas mesmo a minha primeira aula de desenho foi acontecer uns 05 anos mais tarde, e lá o estrago mental já estava feito.
Por isso que até hoje, toda vez que eu conheço alguém que pira em materiais específicos, eu fico martelando a mesma tecla de que "isso não importa" -- é claro que existe uma diferença entre uma aquarela da Faber e uma Lukas, ou um lápis n.2 e um lumograph... Mas ela não é significativa o suficiente para evitar que você faça o que quer.
Adoraria ter escutado isso, repetidas vezes, com 10 anos de idade.
E então vou ficar repetindo isso pelo resto da vida, sempre que puder.
Se você quer desenhar, "mas não tem os materiais certos", NUNCA, NUNCA, NUNCA deixe isso lhe atrapalhar -- você só precisa de papel, lápis ou caneta. Só isso, de qualquer qualidade. E nunca deixe de fazer o que gosta se alguém lhe disser o contrário.
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